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O cômputo dos encargos contratuais incidentes sobre títulos de crédito cobrados em juízo.

Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais nº 69

 

Resumo: O que parecia ser uma tranquila noção – de Direito e de bom senso – a respeito da aplicação de encargos contratuais a determinado crédito que esteja sendo cobrado em juízo, encontrou conflito em posições de respeitados Tribunais (Estaduais e Federais), dando lugar ao presente estudo. A discussão aqui proposta, de especial relevância para o setor financeiro, é também igualmente importante para todos os demais ramos da economia, pois revela certo descompasso entre a lógica econômica dos negócios e a indevida intervenção judicial a que podem se sujeitar.

 

Palavras-chave: Recuperação de crédito – Encargos – Encargos moratórios – Juros compensatórios – Juros moratórios – Títulos de crédito

 

Abstract: What seemed to be a quiet sense – both of law and common sense – regarding the application of contractual charges to credits subject to foreclosure proceedings in Court, turned out to reveal some conflict within the interpretation done by respected Courts (State and Federal), giving rise to the present essay. The discussion proposed herein, particularly relevant for the financial market, is equally important to all other branches of the economy, since it reveals a certain imbalance between the economical business logic and any undue judicial intervention that it may undergo.

 

Keywords: Debts recovery – Charges – Late payment fees – Contractual interest – Legal interest – Instrument of credit

 

Sumário: 1. Conflito de posições nos Tribunais. 2. Pacta sunt servanda e princípio da literalidade

 

  1. Conflito de posições nos Tribunais.

Tem se apresentado na jurisprudência certo dissenso com relação ao método de atualização de dívidas expressas em títulos de crédito ou em outras formas de títulos executivos extrajudiciais.

No correr do tempo, algumas decisões têm proclamado a necessidade de se abandonarem os critérios de incidência de encargos contratualmente ajustados no título, uma vez aforada a ação de execução que vise à cobrança do crédito nele espelhado. Essa corrente sustenta que, uma vez submetida ao processo executivo, a dívida passaria a ser corrigida não mais pelos parâmetros convencionados entre as partes, mas pelo índice adotado para a atualização de débitos judiciais, utilizado pelo respectivo Tribunal de Justiça (via de regra, juros legais acrescidos da variação de algum índice conservador de correção monetária).

Ao que tudo indica, a ratio por trás desse ponto de vista pretoriano estaria na percepção de que, no momento do ajuizamento da execução, o crédito converter-se-ia em um valor consolidado, passando este a ser o objeto da execução.[1] Trata-se, portanto, de algo próximo de uma “novação objetiva judicial”, pela qual a obrigação originária, ao ser submetida à coertio estatal, seria impositivamente convertida em uma outra relação, com um novo objeto e com consequências que não haviam sido previstas – muito menos desejadas – por qualquer das partes. Ou seja: o Judiciário imporia a sujeição de uma obrigação a encargos não resultantes da vontade das partes.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região já se manifestou dessa forma em diversas oportunidades, sendo ilustrativo de seu entendimento o seguinte precedente:

“Extinto o contrato em face do inadimplemento, o débito deve ser consolidado para o ajuizamento da ação e, ajuizado o feito, só tem incidência a correção monetária e os juros moratórios. Nesse sentido, como razão de decidir, transcrevo decisão proferida pelo Des. Federal Amaury Chaves de Athayde nos autos do AI nº 2001.04.01.083692-9/PR, in verbis:

‘A questão versada nos presentes autos já foi examinada por esta douta Turma. Concluiu-se que a matéria pode, sim, ser conhecida ex officio pelo juiz da causa, não o impedindo a falta de alegação da parte interessada nos correspondentes embargos à execução. Tudo porque, ajuizado o feito executório, já não mais subsistem os termos do contrato (e a regulação setorial civilística – de predominante defesa de interesses particulares), aplicando-se, a partir de então, a regência das normas atinentes à atualização monetária e remuneração financeira dos débitos realizados em Juízo.’.” [2]

O Tribunal de Justiça de São Paulo também conta com entendimento nesse sentido:

“Após o ajuizamento de execução de título extrajudicial, a correção monetária e os juros não mais se regulam pelos termos da avença firmada entre as partes sendo que a atualização do débito deve seguir os termos de atualização dos débitos judiciais, incidindo juros de mora legais e correção pela Tabela prática do Tribunal.”[3]

Os aludidos precedentes não levam em consideração que a obrigação é o objeto da execução e que ela, obrigação, continua inadimplida mesmo após o ajuizamento da execução, fazendo incidir até o pagamento os critérios que as partes, livremente, decidiram que (i) remunerariam o capital e (ii) penalizariam a mora.

Mais que isso, alguns julgados – como os acima transcritos – consideram que, com o inadimplemento da obrigação, o contrato se extingue, além de admitirem a intervenção do Judiciário nas disposições patrimoniais privadas da avença, mesmo sem provocação de qualquer das partes (ignora-se o princípio da inércia do juiz – CPC, art. 2º).

O entendimento, com as vênias devidas, não nos parece o mais adequado ao sistema jurídico dos títulos de crédito, especialmente quando considerados conceitos como o pacta sunt servanda e o princípio da literalidade.

O processo de execução, bem se sabe, não é ambiente para criação ou novação de direitos e obrigações (salvo hipóteses excepcionais expressamente previstas em lei), senão simples veículo de cumprimento forçado de obrigações previamente contratadas. Amílcar de Castro define que a execução é “a parte do processo que contém os meios […] de reduzir o título executivo a efeito, sem a vontade do executado”[4]; na execução “obtém-se sem o concurso da vontade do obrigado o que este deveria ter feito para não ferir o interesse do exequente”[5]. Humberto Theodoro Júnior aponta para a mesma conclusão, afirmando que “o processo de execução parte justamente da certeza do direito do credor, atestada pelo ‘título executivo’ de que é portador […] visando a produzir na situação de fato as modificações necessárias para pô-la de acordo com a norma jurídica reconhecida e proclamada no título executivo”[6].

Portanto, se a norma jurídica está proclamada no título executivo (como ato jurídico perfeito que é), não podem surgir para as partes do processo executivo novas obrigações, sendo possível apenas fazer valer o que já estava sacramentado na cártula.

O Desembargador Alexandre Freitas Câmara, nessa linha de raciocínio, afirma que “com a execução forçada o que se quer é, através da substituição da atividade das partes (principalmente da atividade do executado) fazer-se atuar a vontade concreta do direito substancial, mediante a realização prática do direito de crédito existente segundo o direito material.”[7]

Direito de crédito existente segundo o direito material só pode ser aquele contratado pelas partes e inserido no título emitido para corporificar a obrigação do devedor. Imutável, portanto, no âmbito de ação de execução.

Nessas condições, expressiva parte da jurisprudência – com eco na orientação do Superior Tribunal de Justiça – repudia a posição restritiva de que acima se tratou, para prestigiar os princípios orientadores do Direito privado, notadamente aqueles que regem as relações creditícias.

 

  1. Pacta sunt servanda e princípio da literalidade.

Apesar das várias formas de relativização da força vinculante dos contratos que o Direito moderno vem criando, não é ousado afirmar que, especialmente no que se refere às relações cambiárias, continua prevalecendo o pacta sunt servanda como regra geral. Se o título de crédito é sacado entre pessoas capazes, com lastro em negócio lícito e com objeto igualmente legítimo (Código Civil, art. 166), as partes estarão obrigadas por seus termos – com a óbvia ressalva das disposições legais liberatórias.

Reconhecida determinada obrigação no âmbito de um título de crédito (ou executivo, lato sensu), dita obrigação terá eficácia até seu adimplemento perfeito. E se o título de crédito, em essência, representa obrigação pecuniária, também os encargos remuneratórios incorporam-se àquela obrigação. Portanto, enquanto não satisfeita a dívida refletida na cártula, correrão os encargos remuneratórios.

Mas o título poderá estabelecer, adicionalmente – como é de regra –, que, não cumprida a obrigação principal no prazo avençado, ganharão eficácia outras obrigações (ditas acessórias). Surgem, então, os encargos moratórios.

O critério de atualização da dívida, assim, poderá contemplar encargos remuneratórios e encargos moratórios (v.g., juros, correção monetária e multa).

Com relação aos encargos remuneratórios, adotada a premissa de que são parte do principal[8], remunerando o dinheiro devido (normalmente, emprestado), não parece haver qualquer razão a justificar a interrupção da fluência de tal encargo em função do ajuizamento da ação de execução. O argumento ganha ainda mais relevo quando se verifica que as vozes que pregam a alteração do critério de atualização após a judicialização da dívida preveem unicamente a incidência de encargos moratórios para essa “nova etapa” da obrigação. Com efeito, invariavelmente, os precedentes restritivos falam em encargos legais, em critérios de atualização de débitos judiciais, afirmando que “só tem incidência a correção monetária e os juros moratórios”[9].

Se os contratantes livremente ajustaram que a quantia tomada pelo devedor seria remunerada em favor do credor a determinada taxa, não pode o Judiciário, violando a autonomia das partes, modificar a alíquota, tampouco – ainda mais grave – suprimir do título uma obrigação específica (a remuneração do dinheiro), determinando que a partir de dado momento só incidam os encargos da mora.

A esse respeito, Caio Mário, após definir os juros como “acessório de uma obrigação principal pecuniária”, lembra que “na ideia do juro integram-se dois elementos: um que implica na remuneração pelo uso da coisa ou quantia pelo devedor, e outro que é a cobertura do risco que sofre o credor”[10]. A doutrina, então e naturalmente, não ignora – antes, ressalta – a legitimidade e a relevância da observância dos critérios de juros (vale dizer: encargos) no pagamento da obrigação, tanto no aspecto da remuneração do capital, quanto em sua forma de contrapartida pelo risco tomado pelo credor e de penalidade pela demora no cumprimento da obrigação.

Consequentemente, não se pode conceber que, justamente quando o credor se socorre ao Judiciário para, através do monopólio que este detém da coertio, fazer valer seu título, se retire a eficácia de uma (relevante) obrigação contratual. Na maioria dos casos, aliás, a devida remuneração do dinheiro é da própria essência do negócio jurídico, como ocorre, por exemplo, na emissão de cédula de crédito bancário (CCB), título de crédito por disposição legal[11], representativa de uma operação de crédito com uma instituição financeira: o banco, por natureza, só tem interesse em realizar a operação, emprestando recursos à contraparte no negócio, porque espera receber, passado certo tempo, a remuneração contratada, que, assim, é causa determinante do contrato, sem a ocorrência da qual, portanto, as partes não teriam celebrado a avença.

O aventado cessamento dos encargos remuneratórios com a judicialização da dívida representaria inadmissível intervenção judicial na relação contratual privada das partes, ainda mais reprovável quando realizada no âmbito de processo de execução do próprio título executivo – tanto porque a parte, nesse momento, espera justamente o cumprimento forçado do que está expresso na cártula, quanto porque no processo executivo o magistrado não tem jurisdição para criar ou modificar direitos, considerados os princípios da inércia do Judiciário e da adstrição ao pedido (ambos corolários da garantia do devido processo legal). Se o Estado-Juiz, ao invés de simplesmente promover atos executivos tendentes à satisfação do crédito, arvorar-se na atribuição de alterar os termos da relação jurídica subjacente à demanda, terá violado o princípio da demanda, “agindo por iniciativa própria […] na determinação daquilo que constituiria o objeto da prestação jurisdicional”.[12]

A própria noção – externada nos precedentes já acima referidos – de que, inadimplida a obrigação de pagamento corporificada no título, a relação jurídica das partes estaria extinta (nas palavras do TRF4, “extinto o contrato em face do inadimplemento”) afronta o pacta sunt servanda e o princípio da literalidade (além de tantas outras noções elementares de Direito e de bom senso).

O contrato (rectius: a obrigação) não se extingue com o inadimplemento. De modo muito diverso, não cumprida, a obrigação persiste absolutamente eficaz, suscetível de execução específica, e, a propósito do que aqui se discute, faz nascer as já mencionadas obrigações acessórias: os encargos moratórios. O “injusto retardamento no cumprimento da obrigação”[13] ocasiona, assim, o recrudescimento da dívida, nunca sua liberação. Não se extinguindo a obrigação principal pelo incumprimento, também a obrigação acessória (os encargos) mantém-se eficaz.

É Caio Mario quem, novamente, resume a questão de forma categórica: “No primeiro caso [juros convencionais], juntamente com a obrigação principal ou subsequentemente, as partes constituem a obrigação relativa aos juros, acompanhando a outra até a sua extinção”[14]. Ora, se a obrigação principal (a dívida original) não se resolve com o inadimplemento, a obrigação acessória (juros e correção) igualmente fluirá, nos termos contratados, até seu pagamento.

Evidência legal dessa circunstância é que a execução judicial se extingue “quando o devedor satisfaz a obrigação” (CPC, art. 794, I). E a obrigação de que cuida o Código não é aquela “judicial e impositivamente novada” de que se cogitou acima, mas a obrigação assumida pelo devedor ao emitir o título, ao contratar com seu credor. Essa, a obrigação objeto da ação de execução, que, portanto, só terminará com a sua extinção (seja a natural, consistente no cumprimento, seja por meio das demais hipóteses previstas no aludido art. 794).

Justo por isso, o Superior Tribunal de Justiça já assentou, em diversas oportunidades, o entendimento de que os encargos contratados têm eficácia e são devidos até o efetivo pagamento da dívida:

“Essa Corte já estabeleceu que, havendo inadimplência, o termo final para a cobrança dos encargos contratados não é o ajuizamento da ação executiva, mas o efetivo pagamento do débito.”[15]

A correta orientação do STJ é seguida por outras Cortes, do que são exemplo os julgados abaixo:

“EXECUÇÃO DE TÍTULO. EXTRAJUDICIAL CONFISSÃO DE DÍVIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA TAXA REFERENCIAL (TR). LEGALIDADE. Insurgência em face da decisão pela qual o juiz entendeu que deve ser utilizada a TR, prevista contratualmente, como fator de correção monetária, inclusive após o ajuizamento da execução. Índice eleito pelas partes no contrato exequendo. Descabimento de utilização da Tabela Prática deste Tribunal.”[16]

“Quanto ao índice de correção monetária, deve ser observada a convenção entre as partes, incidindo o critério legal, tão-somente, na sua ausência. Desse modo, a atualização deve se dar, com base no IGP-M, conforme estipulado na cláusula nona, do contrato, constante às fls. 25/26 dos autos principais.”[17]

“Correção monetária pelos índices oficiais que incide, tão somente, na falta de convenção entre as partes. Cláusula contratual que deve ser observada, no que tange à incidência do IGPM como fator de correção, tanto na apuração do principal devido quanto das deduções, consideradas as respectivas datas.”[18]

“Em relação ao terceiro ponto controverso, ou seja, a aplicação do índice da poupança para correção dos valores, ao invés do índice aplicado aos débitos judiciais conforme Tabela da Corregedoria Geral de Justiça, merece o tema breve digressão. A aplicação do índice da poupança nos cálculos do débito pelo Contador do Juízo teve por base o estabelecido no Termo de Confissão de Dívida assinado entre as partes. Tendo o débito reclamado pelo apelado exequente fulcro em termo de confissão de dívida assinado pelo apelante executado, e não tendo este trazido aos autos qualquer prova de que tenha havido alteração nos termos ajustados na referida confissão de dívida, de rigor vale o que está expressamente acordado entre as partes, a menos que haja alguma ilegalidade presente, pelo que haveria a possibilidade de revisão do ajuste – o que não se configurou no caso, mantendo-se os termos do provimento impugnado neste ponto.”[19]

“Uma vez que consta na nota de cédula comercial, o seu valor bem como os encargos de inadimplemento que deverão incidir até a sua liquidação, não merece prosperar o entendimento que após o ajuizamento da ação executiva somente deverá incidir sobre o crédito a correção monetária e os juros de mora legais.”[20]

Prestigia-se, portanto, o princípio da literalidade, segundo o qual “o devedor não é obrigado a mais, nem o credor pode ter outros direitos senão aqueles declarados no título.”[21]

Respeita-se, adicionalmente, o princípio da efetividade do processo, assim indefectivelmente definido por Chiovenda: “O processo deve dar, quanto for possível praticamente, a quem tenha um direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir”.[22] Alexandre Câmara aplica a definição de Chiovenda ao processo de execução, afirmando que a execução forçada “só será efetiva à medida que se revelar capaz de assegurar ao titular daquele direito exatamente aquilo que ele tem direito de conseguir. Assim, na execução por quantia certa, o processo de execução só será efetivo se for capaz de assegurar ao exequente a soma em dinheiro a que faz jus.”[23]

Este conceito faz lembrar, aliás, que a obediência à literalidade do título não beneficia exclusiva e necessariamente o credor. Haverá casos em que o parâmetro judicial de atualização da dívida (juros legais acrescidos de correção monetária) será superior ao critério expresso no próprio título. Nessa hipótese, se “abstraídas as condições contratadas”[24], o devedor será cobrado por mais do que as obrigações declaradas no título. Na hipótese inversa, o credor receberá menos do que o pactuado.

O princípio da literalidade dos títulos de crédito (e sua aplicação extensiva aos demais títulos executivos) é guardião do ato jurídico perfeito e da segurança jurídica com que as partes, em presumível boa-fé, pretendiam contratar, preestabelecendo condições que lhes permitiam saber exatamente qual seria o valor da obrigação, na data de seu efetivo adimplemento (ainda que tardio).

O Tribunal de Justiça de São Paulo abordou a questão do ato jurídico perfeito e do pacta sunt servanda com olhar prático e realista, considerando as ilícitas manobras de que os devedores podem querer se valer e que, de modo algum, devem ser coonestadas pelo Judiciário:

“É que, assentada a legitimidade dos dispositivos inseridos na cédula de crédito bancário em exame, não se justifica a tese de que tenha o banco de abdicar do cômputo dos encargos contratuais validamente convencionados pelas partes em função de ter sido compelido a vir a juízo para executar a dívida, como que a premiar o devedor inadimplente que optou por postergar o cumprimento de suas obrigações com o propósito de discutir judicialmente, sem fundamento jurídico relevante, cláusulas contratuais de cristalina compreensão e licitude a tornar impositivo que, na apuração do débito, sejam considerados os encargos financeiros pactuados no título exequendo, até integral liquidação da dívida.”[25]

No mesmíssimo sentido e também por aqueles fundamentos, decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

“Existindo expressa previsão contratual quanto aos encargos incidentes em razão do inadimplemento, não se mostra cabível que, após o ajuizamento da ação, o saldo devedor decorrente do título executivo passe a ser atualizado apenas pelos incides da CGJ e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês.

A limitação da incidência de tais encargos até a propositura da ação ocasionaria o enriquecimento injustificado dos executados em detrimento da exequente, tornando vantajosa a inadimplência daqueles, posto que, ajuizado o feito executivo, a evolução do débito passaria a ser menor do que antes de instaurado o processo, punindo quem procurou a satisfação de seu crédito, pela via judicial.”[26]

Nessas condições, e com as vênias devidas ao entendimento contrário, parece-nos difícil encontrar fundamento qualquer que seja para se defender o afastamento impositivo de condições livremente postas no título de crédito, à vista da exclusiva circunstância de o credor pretender o socorro judicial para receber aquilo que lhe é legitimamente devido.

[1]    O Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim enfrentou o tema: “Distinção indispensável entre valor do contrato executado e valor atualizado do que foi objeto da execução, por constituírem duas situações jurídicas distintas, que não permitem a adoção de idêntico critério para os fins a que se dirigem.” (AI nº 1999.04.01.013529-3/RS, rel. Des. Federal Sílvia Goraieb, DJU 26.07.2000)

[2] 3ª Turma, rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, AI nº 2001.04.01.072814-8/PR

[3]    20ª Câmara de Direito Privado, AI nº 2011336-16.2013.8.26.0000, rel. Des. Maria Lúcia Pizzotti, j. 25.11.2013.

[4]    Do Procedimento de Execução, Forense, 2ª edição, Rio de Janeiro, 2000, p. 4.

[5]    Do Procedimento de Execução, Forense, 2ª edição, Rio de Janeiro, 2000, p. 7.

[6]    Curso de Direito Processual Civil, v. II, Forense, 29ª edição, Rio de Janeiro, 2000, p. 5.

[7]    Lições de Direito Processual Civil, v. II, Atlas, 21ª edição, São Paulo, 2012, p. 161 – destaques do original.

[8]    Admita-se, aqui, a noção de que a obrigação principal não equivale, necessariamente, ao valor tomado emprestado. Ao contrário, a obrigação principal do devedor é a contraprestação pelo empréstimo, e nesta podem já estar incluídos os juros remuneratórios (v.g., se X empresta a Y R$ 100.000,00, em troca de receber, 10 meses depois, R$ 120.000,00, é a este valor que corresponde a obrigação principal de Y, que, se atrasada, poderá ser incrementada com encargos moratórios – obrigação acessória).

[9]    TRF4, AI nº 2001.04.01.072814-8/PR, 3ª Turma, rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, j. 15.02.05.

[10] Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições do Direito Civil, v. II, Forense, 16ª edição, Rio de Janeiro, 1998, p. 86.

[11]   Lei nº 10.931/04, art. 26: “A Cédula de Crédito Bancário é título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.

[12]  Theodoro Jr., Humberto. Curso de Direito Processual Civil, v. I, Forense, 41ª edição, Rio de Janeiro, p. 468.

[13] Gomes, Orlando. Obrigações, Forense, 8ª edição, Rio de Janeiro, 1994, p. 200.

[14] Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições do Direito Civil, v. II, Forense, 16ª edição, Rio de Janeiro, 1998, p. 86.

[15]   4ª Turma, REsp nº 402.425/SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 09.03.2010. No mesmo sentido: REsp 200200940637, Min. Aldir Passarinho, 4ª Turma; REsp 200100715806, Min. Aldir Passarinho, 4ª Turma; REsp 199600673136, Min. Barros Monteiro, 4ª Turma.

[16]   TJSP, AI nº 2048917-31.2014.8.26.0000, 15ª Câmara de Direito Privado, rel. Des. Castro Figliolia, j. 18.08.2014

[17]   TJRJ, AC nº 0086240-34.2007.8.19.0004, 9ª Câmara Cível, rel. Des. Carlos Santos de Oliveira, j. 24.04.2012.

[18]   TJRJ, AI nº 0034207-40.2011.8.19.0000, 16ª Câmara Cível, rel. des. Mauro Dickstein, j. 07.02.2012.

[19] TJRJ, AC nº 0137922-71.2006.8.19.0001, 6ª Câmara Cível,  rel. Des. Nagib Slaibi, j. 10.08.2011.

[20] TJMG, A.I. nº 1.0024.04.254313-2/001, 4ª CC, j. 23.08.12.

[21] Luiz Emydgio F. da Rosa Jr.. Títulos de Crédito, Renovar, 7ª edição, Rio de Janeiro, p. 61.

[22]   Giuseppe Chiovenda, Instituições de Direito Processual Civil, v. II, Bookseller, 2ª edição, p. 46 – destaques do original.

[23] Lições de Direito Processual Civil, v. II, Atlas, 21ª edição, São Paulo, 2012, p. 165.

[24] TRF4, AI nº 97.04.16180-8/PR.

[25] A.C. 0006558-15.2010.8.26.0009, 19ª Câmara de Direito Privado, rel. Des. João Camillo de Almeida Prado Costa, j. 28.01.2013.

[26] A.C. 1.0283.09.011383-0/001, 17ª Câmara Cível, rel. Des, Eduardo Mariné da Cunha, j. 06.06.2013.



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Marcelo Levitinas

Data de Publicação

01/07/2015